Louvar o casamento! Louvar a promessa que fazem dois seres…de nunca mais mudarem de opinião… de vontade…de vida! Existirá promessa mais mortífera? Quem ousaria em plena consciência ligar a sua vida a uma personagem indefinida, que das suas mil caras, mostrou apenas uma, ou duas, quando muito três e que de ti só conhece alguns pequenos indícios? Casar duas individualidades, dois esboços de seres! Porque não se trata concretamente de pessoas mas de impulsos, de transformações, de vagas encapeladas. Se tu pelo menos soubesses quem és, quem albergas e quem te habita, já seria um começo.
[...] Está bem, de acordo, mas como é que não se pode sentir o vento do abismo na natureza transitiva do verbo amar? Aquele que ama…? Aquela que ama…? Como não sentir um vazio enfadonho no fim de cada frase? Quem ama quem? Quem ama o quê? Não será o outro o produto ardente, sublime e generoso do teu imaginário, dessa fome de amar que te fez vir ao mundo, como o jovem lobo a sair da sua toca? Fome de comida, fome de luz, fome de acção, fome de êxtase, fome de ervas, de obstáculos e de deliciosas loucuras? Quem te assegura que este ser amado continuará a ser aquele que tu crês ter visto? Que cara te revelará dentro de uma hora, um mês, um ano, sete anos? Reconhecê-lo-ás subitamente na rua com outro casaco, outro chapéu? |